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A criação de uma rede de ensino público foi planejada pelos reformadores luteranos a pedido de governantes que perceberam a urgência de oferecer instrução ao povo. O interesse dos príncipes era fortalecer seus domínios num tempo de constantes hostilidades entre os Estados. "Lutero argumentou que o dinheiro investido em educação seria muito menor do que o gasto com armas e traria benefícios mais profundos", diz o pastor Walter Altmann. E você, que argumento utilizaria, nos dias de hoje, a favor da educação para todos?
A idéia da escola pública e para todos, organizada em três grandes ciclos (fundamental, médio e superior) e voltada para o saber útil nasce do projeto educacional de Lutero. "A distinção clara entre a esfera espiritual e as coisas do mundo propiciou um avanço para o conhecimento e o exercício funcional das coisas práticas", diz o pastor Walter Altmann, presidente da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil.
O primeiro foi a venda de indulgências pela Igreja. Segundo esse costume, que se iniciou na última fase da Idade Média, os fiéis podiam comprar, de um representante do clero, parte da absolvição de seus pecados. A prática era oficial, aprovada pelo papa e vinha acompanhada de um ritual solene. O comércio de indulgências representava uma espécie de resumo do que havia de mais condenável no comportamento da Igreja daquele tempo: ganância, ostentação, arbitrariedade e mundanismo. As deturpações do cristianismo incomodavam os poderes locais e repugnavam os intelectuais.
Lutero sempre havia pregado contra as indulgências, mas o que o levou a realizar um protesto público, em 1517, foi a venda de uma indulgência especial, que oferecia privilégios específicos, lançada pelo Vaticano para financiar a reconstrução da Basílica de São Pedro. Contra ela, Lutero elaborou 95 teses, criticando as práticas eclesiásticas, e afixou-as na porta da Igreja do Castelo de Wittenberg. Foi o início do conflito entre o monge alemão e a autoridade papal.
A segunda grande inquietação de Lutero tinha origem doutrinária e o atormentou durante seus anos de formação. Ele não aceitava o princípio, então dominante no cristianismo, de que a justiça divina se manifestava, no plano terreno, como um julgamento dos atos dos homens. Para Lutero, isso produzia medo e tornava praticamente impossível o sentimento espontâneo de amor a Deus. A indignação de Lutero só se dissipou quando, ao interpretar os Evangelhos, concluiu que os homens vivem por uma graça de Deus e que a justiça divina é revelada pelas escrituras de modo passivo e independentemente dos méritos ou ações de cada um durante a vida. Foi o que se tornou conhecido como doutrina da salvação pela fé.
Lutero tinha um projeto inovador, mas abominava a possibilidade de se tornar porta-voz de qualquer idéia ou ambição revolucionária. Mesmo assim, o surgimento do protestantismo foi ao encontro dos desejos da classe economicamente emergente de comerciantes, para quem a educação representava uma possibilidade de aceitação e ascendência social. Nas primeiras décadas do século 16, o Sacro Império Romano-Germânico era um mosaico de principados mais ou menos independentes. Os interesses político-econômicos do imperador, da Igreja e dos príncipes emperravam uns aos outros. Os príncipes, menos obrigados ao poder papal do que o imperador, viram em Lutero uma possibilidade de se afirmar politicamente contra a autoridade central e de contestar os direitos da Igreja sobre riquezas que se encontravam em seus territórios.
O fato de Lutero não acreditar que a salvação da alma estivesse vinculada às ações em vida não implicava descaso pelas coisas mundanas. Ao desvincular as esferas do poder espiritual e do poder temporal, Lutero atribuía ao último a responsabilidade de administração da vontade de Deus — por isso a obediência civil seria um dever moral e a rebelião um pecado. "A ligação entre os dois mundos é a fé, porque os que crêem são também vocacionados para servir o próximo na sociedade", diz o pastor Altmann.
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